O espaço moderado olha para os possíveis candidatos presidenciais, de que lhe vão falando, tentando encontrar duas simples características que muitos e bons políticos do tempo corrente não revelam – empatia e compaixão. E é aí que Leonor Beleza será imbatível.
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Marcelo Rebelo de Sousa cumpriu sete anos na função de Presidente da República. Para assinalar a data concedeu uma entrevista ao Público e à RTP em que nos revelou todas as pessoas que dentro dele existem, uma visão pessoana do papel de Chefe do Estado.
O país que encontrou, em 2016, tinha saído da Troika, entrou numa pandemia e está agora atacado por uma guerra. Os primeiros anos de Marcelo foram muito importantes, porque neles esteve o acolhimento que faltava a Cavaco Silva, a palavra que se revelava perante a tragédia. Hoje, porém, as quatro aparições, num único telejornal, em que o estadista dá lugar ao comentador ou ao professor, estão a cansar os portugueses, a promover um processo acelerado de desligamento.
Que tipo de Presidente elegerão os portugueses depois de Marcelo?
Temos para nós que a eleição para Presidente da República será, num tempo de polarização, populismo e propaganda, a escolha do centro, a eleição de alguém que reúna, em si, três características essenciais: percurso, autoridade e empatia.
No espaço das direitas políticas temos três nomes em avaliação – Pedro Passos, Paulo Portas e Marques Mendes; no campo das esquerdas vai-se insistindo em Ana Gomes e Augusto Santos Silva. Todas estas personalidades estão distantes, ao dia de hoje, do cumprimento integral dos critérios.
Está claro que António Costa seria o melhor candidato do espaço que normalmente se designa de centro-esquerda, nele votaríamos sem pestanejar por razões muito pessoais, mas Costa tem insistido no seu desinteresse pela função. Confessamos que não desgostaríamos de o ver Presidente da Fundação Gulbenkian, fazendo-a renascer e voltar ao tempo em que era o grande promotor de cultura e ciência em Portugal.
O nosso sistema político é anacrónico. Eleger um Presidente da República por voto direto é coisa que só existe hoje porque os constituintes estavam marcados pelo regime de presidencialismo invertido que Salazar construiu. O que importaria, em Portugal, deveria ser a eleição indireta do PR por um colégio que integrasse dos deputados nacionais, regionais e os presidentes das assembleias municipais…
A exposição pública, a que as campanhas eleitorais obrigam os candidatos, desmobiliza muitos e bons presidenciáveis, limita a escolha de muito boa gente da academia, da justiça, dos setores financeiro ou cultural.
Este é o cenário, e nele importa uma análise do que podemos ter para o próximo tempo.
Conhecemos Leonor Beleza na Assembleia da República. Integrávamos ambos a mesa do Parlamento e cumpríamos religiosamente o passo marcado de Mota Amaral nas Conferências de Líderes. É importante afirmar que sempre a encontrámos no campo social-democrata, muito mais à esquerda do que muitos dos dirigentes socialistas que vindos do MES, por exemplo, que aprofundaram a sua condição burguesa e se distanciaram da realidade.
Beleza tem três marcas no seu percurso público que importa não esquecer: 1. Uma vida cívica impar, mesmo que a tenham tentado manchar com o longo processo dos hemofílicos; 2. Uma vida política muito sustentada e transversal que vai de Secretária de Estado da Presidência, com Balsemão, a Ministra da Saúde, com Cavaco, passando pela relevante pasta da Segurança Social, na altura da grande crise política, económica e social que se viveu durante no governo de Mário Soares, entre 1983 e 1985; 3. Uma vida de realizações que se revela na construção de uma obra única no campo da saúde e da ciência, significativa no espaço europeu e que se confirma na irradiação do conhecimento e das práticas clínicas a todo o nosso país.
E tudo isto é relevante para a análise que fazemos do que se pede ao próximo Presidente da República – uma leitura de país que assente na realidade política do ontem e do hoje, a experiência para a boa escolha dos antídotos necessários ao radicalismo e à polarização.
Leonor Beleza assume, ainda, o elemento central da função – proximidade sem populismo. Não é da sua natureza a palavra desnecessária, a qualificação e quantificação dos atos políticos correntes, a escolha a dedo dos bonecos a abater. A palavra, em Beleza, tem um peso, o peso de ser tão rara, mas tão forte, que sempre que a usa produz consequência. Era assim como deputada e vice-presidente do parlamento.
O PSD apoiou, no segundo mandato, Mário Soares; o PS, mesmo que não o tenha feito por decisão certificada, apoiou Marcelo Rebelo de Sousa na renovação do tempo de serviço. Portugal, os portugueses, já se desligaram das opções bipolares nas escolhas presidenciais.
A direita lá mais à direita terá sempre Ventura, a esquerda mais encostada terá sempre Catarina Martins e João Ferreira/Oliveira. O espaço moderado olha para os possíveis candidatos presidenciais, de que lhe vão falando, tentando encontrar duas simples características que muitos e bons políticos do tempo corrente não revelam – empatia e compaixão. E é aí que Leonor Beleza se confirma imbatível.
E se outra razão no houvesse, sempre se poderia eleger o pioneirismo de Leonor na afirmação das políticas de igualdade. Portugal tarda no encontro de uma mulher para a mais alta magistratura. Ela está bem visível quando as universidades a elegem Honoris Causa, quando os centros de investigação lhe atribuem prémios. Portugal talvez de si precise.
Ascenso Simões